Um dos eixos de atuação do Observatório do uso de medicamentos e outras drogas pauta-se pelo direito ao uso da maconha (Cannabis sp.) para fins terapêuticos e medicinais, buscando difundir informações científicas atuais, bem como os principais mecanismos de ação da planta e barreiras à universalização do acesso. Consta em arquivos históricos que a maconha foi uma das primeiras espécies vegetais a ser transportada e cultivada pelos homens nômades - dando início à agricultura - há cerca de 10 mil anos. Da região do Tibet, a planta circulou pela Eurásia, África, Europa e Américas, sendo hoje presente e utilizada em todo o mundo, ainda que de forma ilegal. Historicamente, seu uso destinava-se a produção de fibras, cordas, tecidos, resinas, óleos que serviam de combustível e iluminação (China/Europa/Américas), chás que eram administrados para desinibir as noivas na noite de núpcias (Índia), medicamentos (China) e em rituais de lazer e cura espiritual (África/Américas).
No Brasil, a maconha foi comercializada livremente nas boticas até meados dos anos 1930, quando surge a primeira proibição oficial explícita sobre a planta, embora ela fosse até então indicada e utilizada para combater espasmos, catarro, asma, insônia, falta de apetite, desânimo, diarreias, entre outros problemas de saúde, em adultos e crianças. Cada vez mais as pesquisas científicas ao redor do mundo revelam e confirmam diversos efeitos terapêuticos já relatados em usos tradicionais da planta. No entanto, no Brasil, as leis ainda são bastante rígidas, mesmo quando se trata do desenvolvimento de pesquisas e do uso para fins terapêuticos e medicinais. A despeito da ausência de regulamentação, milhares de pessoas vêm utilizando a maconha como medicamento, ainda que clandestinamente. Atualmente, para que uma pessoa seja autorizada a utilizar a maconha ou os seus derivados, é necessário que um médico a acompanhe, emita um laudo e prescreva a medicação.
Ao mesmo tempo, judicialmente, é necessário comprovar que este tratamento lhe trará efetiva melhora, o que, na prática, torna-se bastante contraditório, já que para comprovar tal melhora é necessário usar a medicação. Para ampliar a luta coletiva pelo direito ao uso da maconha nos tratamentos de saúde, cada vez mais as pessoas têm se organizado em Associações - formadas geralmente por familiares, pacientes, pesquisadores, advogados, profissionais de saúde e outros atores importantes na defesa de direitos.
Nesse sentido, este eixo do Observatório pretende:
(1) reunir material científico atualizado acerca dos aspectos históricos, culturais, químicos e farmacológicos da maconha, (2) traduzir o conhecimento científico para uma linguagem acessível à população geral, (3) mapear as principais associações atuantes hoje no Brasil, identificando a conjuntura atual da luta pelo acesso à maconha para fins terapêuticos e medicinais, as principais linhas de atuação dessas associações, indicações da planta e barreiras de acesso. Serão trazidas questões que promovam a reflexão sobre essa planta possuir substâncias capazes de produzir efeitos terapêuticos e também adversos, como qualquer outra espécie de planta utilizada na fitoterapia.
Enfim, pretendemos desmistificar e ao mesmo tempo trazer informações sobre benefícios e riscos do uso dessa planta, traduzindo o conhecimento acadêmico-científico para uma linguagem acessível à população, através de jornais e vídeos. Assim, esperamos promover e ampliar esse debate com toda a população e desestigmatizar o tema. Acreditando que a educação popular e a informação são fundamentais para o amplo exercício da cidadania, esperamos que este trabalho seja uma importante ferramenta de defesa da democracia, dos direitos humanos e do direito à saúde.
Eliana Rodrigues
Luiza Coqueiro
Fernanda Soncini
Luciana Togni Surjus
Claudia Fegadolli
Maconhanew's é uma publicação bimensal do Observatório do uso de medicamentos e outras drogas da Unifesp e parceiros.
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Para saber mais, acesse: Observatório do Uso de Medicamentos e Outras Drogas