Professora: Profª. Drª Alessandra Affortunati Martins
Entre 1934 e 1938, Freud está obcecado pela controversa imagem de um Moisés que não seria judeu, mas sim egípcio. Quando redige O homem Moisés e a religião monoteísta circunscreve a categoria de estrangeiro que será decisiva para debates contemporâneos da psicanálise e da filosofia anticolonialista e não-identitárias. Seu Moisés foi escrito no calor da hora: com a anexação da Áustria pela Alemanha nazista de Hitler, Freud será obrigado a exilar-se na Inglaterra, aprofundando seus afetos relacionados à posição de estrangeiro, já experimentada na pele como judeu-europeu. A ousada tese freudiana é capaz de romper com toda historiografia eurocêntrica e judaico-cristã do Ocidente, como mostra Edward Said em Freud e os não-europeus. Com a noção de estrangeiro, Freud subverte tanto os ideais nazifascistas de pureza da raça e de nacionalismo, como os ideais sionistas pautados na identidade judaica.
No curso, a articulação de Freud com Benjamin visará aprofundar o caráter estrangeiro inerente à linguagem da tradução e o lugar em que o estrangeiro se situa, o limiar. Diferente da noção de fronteira, simples divisória identitária entre dois territórios distintos, Benjamin amplia e concede densidade a um lugar de passagem. Analisaremos como desse suposto “não-lugar” nascem outras formas estéticas e éticas. A partir da análise de alguns textos de Walter Benjamin sobre fascismo e modernidade será possível elucidar a vivacidade dos debates anticolonialistas e não-identitários mencionados e observar os meandros da clínica psicanalítica e da política contemporânea, pautada em aspectos identitários de sujeitos suplantados pela lógica unívoca da mercadoria.