Compreender as necessidades para garantir os direitos a partir do CAPSad: perfil de usuários e uso de medicamentos.
Adriana Marcassa Tucci, Natália Araújo dos Santos,
Luciana Togni de Lima e Silva Surjus,
Claudia Fegadolli
O Centro de Atenção Psicossocial de referência para problemas com álcool e outras drogas (CAPSad) é um serviço comunitário para o tratamento de pessoas com problemas relacionados ao uso de drogas. Composto por uma equipe interprofissional e interdisciplinar, que trabalha por meio de intervenções psicossociais formuladas a partir das necessidades específicas de cada pessoa atendida, o CAPSad tem sido compreendido como um dispositivo público estratégico para a garantia de direitos e para a redução do estigma das pessoas que usam drogas.
O uso de álcool e outras drogas é uma prática cultural antiga, mas o consumo abusivo e a dependência dessas substâncias são problemas crescentes de saúde pública, que podem acarretar ou intensificar prejuízos à vida das pessoas, famílias e comunidades.
Segundo os critérios diagnósticos do Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5.ª edição (DSM-V), o abuso de substâncias é caracterizado pelo uso de maneira recorrente e desadaptada, levando a problemas sociais, legais ou familiares, que causam disfunção ou doença clinicamente significativa. Além disso, a dependência, caracterizada por um padrão desadaptado de uso, leva a perturbações clinicamente importantes e necessariamente associadas com a dificuldade de controlar o comportamento de autoadministração da substância, com sintomas de retirada quando há suspensão do seu uso e com tolerância aos efeitos da droga.
No caso de problemas com drogas, as determinações sociais do processo saúde –adoecimento incluem o histórico de criminalização e uso de algumas substâncias, com consequente estigmatização, encarceramento e extermínio da juventude negra e pobre, além das desigualdades econômicas, étnico-raciais e de gênero. Esses fatores tanto tornam maiores as chances de que o uso de drogas se torne problemático, como aprofundam as dificuldades para a recuperação das pessoas.
O Observatório do uso de medicamentos e outras drogas propõe agregar a esse cenário outra possível contradição, que diz respeito ao risco de, reduzindo ou priorizando as ofertas de tratamento que envolvem o uso de medicamentos, negarmos as demais necessidades e complexificarmos ainda mais os problemas com drogas ao inserirmos novas substâncias numa condição anteriormente já problemática.
Como uma primeira ação para subsidiar esse debate, foi realizado um levantamento bibliográfico dos últimos dez anos na base de dados científicos Scielo e no Scholar Google, em que se objetivou identificar as produções já divulgadas acerca do perfil de usuários de CAPSad, bem como os medicamentos mais utilizados por esses usuários.
O resultado da busca evidenciou a escassez de estudos que descrevem esse perfil, assim como os medicamentos utilizados. Foram avaliadas 15 referências nacionais em diferentes cidades e anos de publicação. Dentre o perfil dos usuários do CAPSad, constava que a maioria era do sexo masculino, sendo identificado que as mulheres abandonam o tratamento mais precocemente que os homens, antes de completarem três meses. A busca pelo tratamento se deu majoritariamente pelo uso de álcool para ambos os sexos, seguido pelo uso de cocaína, maconha, crack e outras drogas.
Em relação à idade, as pessoas atendidas tinham entre 19 e 60 anos. O estado civil foi variado, tendo um número muito próximo de pessoas solteiras e casadas. Apesar de uma encontrada variedade socioeconômica, a grande maioria dos atendidos possui baixa renda, apenas o ensino fundamental, sendo o percentual de pessoas empregadas e desempregadas muito próximo.
Foi também evidenciado que a maioria dos usuários se encontra em situação de conflitos familiares, tendo a maioria chegado no serviço por solicitação da família. Quanto ainda à origem dos encaminhamentos, foram encontradas demandas espontâneas, encaminhamento via pronto socorro e por medida judicial. Como fatores relevantes para a permanência no tratamento, foram identificados a iniciativa da própria pessoa em dar continuidade ao processo, apoio e participação familiar.
Em sua maioria, os usuários de CAPSad, além das diferentes estratégias envolvidas no cuidado psicossocial, utilizam continuamente medicamentos, sendo os mais utilizados antidepressivos, ansiolíticos, anticonvulsivantes, estabilizadores de humor, neurolépticos (incluídos os antipsicóticos) e benzodiazepínicos, comumente associados a protetores gástricos e drogas antiparkinsonianas.
As próximas ações planejadas pelo Observatório do uso de medicamentos e outras drogas envolvem parceria direta com CAPSad para identificar as informações disponíveis em prontuários, inicialmente, no município do Guarujá, para melhor mapeamento das condições socioeconômicas e das principais necessidades, bem como das principais respostas assistenciais às pessoas atendidas, incluindo o consumo de medicamentos, com vistas a avançar nas práticas de cuidado emancipatórias, cidadãs e transformadoras da realidade de desigualdade em nosso país.
Contatos: observameddrogas@gmail.com